terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Certo dia fiz uma expedição etnográfica

É engraçado que coisas passageiras, corriqueiras, cotidianas e comuns, pelo olhar estrangeiro são coisas raras e exóticas, que exigem registro e observação.
Certo dia fiz uma expedição etnográfica a um mundo distante, desconhecido do meu mundo. Levei meus lápis, meu caderno de papéis em brancos, e é claro, minha caixa de aquarelas (e alguns outros apetrechos a mais). Com o intuito de registrar através de desenhos, animais e plantas nativas, e acima de tudo, os seres estranhos que habitam aquela terra desconhecida.
Nesta expedição artística e científica, comecei a o não só entender este mundo novo, mas a entender melhor o meu mundo. Ao abrir trilhas novas comecei a pensar nos caminhos que já trilhei. E ao conhecer cada ser, cada vida naquele mundo, me voltei a pensar profundamente na minha forma de vida.
Naquele mundo vi cores que não existem na minha caixa de aquarelas, nem mesmo em meu mundo e nem mesmo existem nomes para representá-las. Degustei sabores de frutos que nunca poderei explicar e não há desenho algum que possa expressá-los. Assim como senti cheiros, texturas e sensações inexplicáveis. E ouvi sons que nunca poderei imitar.
Portanto ao me deparar com estas dificuldades de registro, deixei de lado os meus lápis, o caderno de folhas em brancos e minha caixa de aquarelas, e fiquei só com a observação. E a observação virou presença, que virou experiência, que virou vivência de vida.
Tão logo, ao me olhar no meu pequeno espelho, que levo comigo, não reconheci mais a mesma imagem daquela que antes havia se lançado na expedição. Não me reconheci, e neste desconhecimento, me encontrei. E o mundo desconhecido virou o meu. Virou parte do meu mundo conhecido. Virou parte de mim.
Meu caderno de folhas em brancos manteve-se em branco. Mas meus olhos voltaram com todas as cores e minha boca voltou cheia de estórias para contar. Porém as pessoas que vivem este mundo não têm tempo de ouvir estórias, não tem tempo de fazer estórias e nem mesmo têm tempo de viver histórias. Elas vivem suas vidas em branco e morrem sem histórias para contar.

Guadalupe Rausch

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