É
engraçado que coisas passageiras, corriqueiras, cotidianas e comuns,
pelo olhar estrangeiro são coisas raras e exóticas, que exigem
registro e observação.
Certo
dia fiz uma expedição etnográfica a um mundo distante,
desconhecido do meu mundo. Levei meus lápis, meu caderno de papéis
em brancos, e é claro, minha caixa de aquarelas (e alguns outros
apetrechos a mais). Com o intuito de registrar através de desenhos,
animais e plantas nativas, e acima de tudo, os seres estranhos que
habitam aquela terra desconhecida.
Nesta
expedição artística e científica, comecei a o não só entender
este mundo novo, mas a entender melhor o meu mundo. Ao abrir trilhas
novas comecei a pensar nos caminhos que já trilhei. E ao conhecer
cada ser, cada vida naquele mundo, me voltei a pensar profundamente
na minha forma de vida.
Naquele
mundo vi cores que não existem na minha caixa de aquarelas, nem
mesmo em meu mundo e nem mesmo existem nomes para representá-las.
Degustei sabores de frutos que nunca poderei explicar e não há
desenho algum que possa expressá-los. Assim como senti cheiros,
texturas e sensações inexplicáveis. E ouvi sons que nunca poderei
imitar.
Portanto
ao me deparar com estas dificuldades de registro, deixei de lado os
meus lápis, o caderno de folhas em brancos e minha caixa de
aquarelas, e fiquei só com a observação. E a observação virou
presença, que virou experiência, que virou vivência de vida.
Tão
logo, ao me olhar no meu pequeno espelho, que levo comigo, não
reconheci mais a mesma imagem daquela que antes havia se lançado na
expedição. Não me reconheci, e neste desconhecimento, me
encontrei. E o mundo desconhecido virou o meu. Virou parte do meu
mundo conhecido. Virou parte de mim.
Meu
caderno de folhas em brancos manteve-se em branco. Mas meus olhos
voltaram com todas as cores e minha boca voltou cheia de estórias
para contar. Porém as pessoas que vivem este mundo não têm tempo
de ouvir estórias, não tem tempo de fazer estórias e nem mesmo têm
tempo de viver histórias. Elas vivem suas vidas em branco e morrem
sem histórias para contar.
Guadalupe
Rausch
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